quinta-feira, 12 de julho de 2012

VENDE-SE UM LAUDO MÉDICO PERICIAL

Colaboração do Dr.Marcos Henrique Mendanha

"Prezados leitores.

Eis uma questão polêmica: honorários do perito médico na Justiça do Trabalho.
Vejamos o texto da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), em seu art. 790-B (redação dada pela Lei 10.537 / 2002):
“A responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais é da parte sucumbente na pretensão objeto da perícia, salvo se beneficiária de justiça gratuita.”
Explicando: Imaginemos uma perícia médica que pretende definir se a origem de uma determinada doença de um empregado tem (ou não) nexo com o trabalho exercido na empresa X

a) Se o perito entender que há nexo entre a alegada doença e o trabalho realizado, isso significa dizer que a empresa X “perdeu” a perícia (é parte sucumbente), portanto, a empresa X pagará os honorários do perito.

b) Se o perito entender que não há nexo entre a alegada doença e o trabalho realizado, isso equivale a dizer que o empregado “perdeu” a perícia (é parte sucumbente), e portanto, o empregado deverá custear os honorários do perito.

No entanto, na maioria das vezes (seguramente, mais do que em 90% dos casos), o (ex-) empregado que aciona juridicamente a empresa na Justiça do Trabalho goza dos benefícios da justiça gratuita, nos termos do art. 5, inciso LXXIV da Constituição Federal de 1988, que assim coloca:

"O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos.”
Em regra, essa comprovação de insuficiência de recursos é dada mediante simples afirmação, nos termos do vigente art. 4 da Lei 1.060 / 1950 (redação dada pela Lei 7.510 / 1986):

“A parte gozará dos benefícios da assistência judiciária, mediante simples afirmação, na própria petição inicial, de que não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo próprio ou de sua família.”

Ainda sobre o tema, assim se posicionou o Tribunal Regional Federal da 1a Região ao definir “justiça gratuita”:

"Justiça Gratuita - Concessão mediante simples afirmação, pela parte, de que não tem condições de suportar o pagamento da verba - inteligência do art.4° da Lei 1.060/50 que não conflita com o disposto no art.5°, LXXIV da Constituição Federal" (TRF - 1a. Região na RT 746/403)."

Resumindo, comumente, se o empregado apenas afirmar através de seu advogado que está com insuficiência de recursos, ainda que goze de um alto padrão de vida, a ele será dado o benefício da justiça gratuita. Sendo assim, caso esse empregado seja o perdedor (parte sucumbente) na perícia, quem irá pagar os honorários do perito, na realidade, será o Estado, e não o empregado.

Lamentavelmente, é corriqueiro que as tabelas de honorários propostas pelo Estado (Tribunais, etc.) sejam menores do que os valores de honorários determinados às empresas em sentenças judiciais. Isso sem falar na imensa demora no recebimento dos honorários pelo perito médico, quando estes honorários são custeados pelo Estado.

O que um juiz leva em conta na hora de arbitrar os honorários do perito? Usando o Princípio da Razoabilidade (para alguns juristas, Princípio da Racionalidade), além de características relacionadas à complexidade da perícia e grau de competência do perito, o magistrado deverá considerar também a capacidade financeira das partes, conforme nos ensinou a (revogada, porém significante) Lei 6.032/1974.

Considerando o item “capacidade financeira das partes”, é razoável admitir, por exemplo, que bancos e grandes organizações financeiras tenham condições majoradas para custear, de forma robusta, os honorários periciais. Inúmeras empresas pequenas já não gozam dessa possibilidade.

Imaginem agora uma perícia médica na Justiça do Trabalho para avaliação de um determinado transtorno psiquiátrico, ou de uma doença do grupo das LER / DORTs, atribuídos ao trabalho em um determinado banco.

Quais exames complementares concluem pelo diagnóstico de tais doenças? Nenhum. Nos dois casos, de acordo com a atual literatura médica vigente, o diagnóstico será firmado em critérios fundamentalmente clínicos (dependerá sobretudo da avaliação que o médico fará sobre o periciando).

Assim como existem bons e maus juízes, políticos, pastores, padres, advogados, etc., existem também bons e maus médicos. Importante: cremos que os maus (em todas as categorias profissionais) sejam a minoria. Imaginem agora que o perito médico da situação narrada tenha um caráter questionável, e que não tenha sido nomeado nenhum assistente técnico para acompanhá-lo. Qual será a pré-disposição dele: beneficiar o empregado, ou o banco? Receber os honorários do banco (provavelmente maiores e de forma mais rápida) ou do Estado (provavelmente menores e de forma mais demorada)? Respondeu corretamente quem entendeu que o hipotético e corrupto perito médico tenha a pré-disposição de beneficiar o empregado para receber o seu (maior) honorário diretamente do banco.

A questão que levantamos nesse texto é tão grave que em alguns fóruns trabalhistas já se fala que “pelo perito médico indicado já se conhece a sentença do juiz”, uma vez que, na Justiça do Trabalho brasileira, o índice de concordância entre o laudo pericial e a sentença prolatada pelo magistrado seguramente atinge a maioria dos casos, no que tange às doenças relacionadas ao trabalho.

Diante de todo exposto, deixamos aqui algumas considerações:

1) Empresas, não permitam que uma perícia médica, para averiguação de uma doença ocupacional, ocorra sem a devida indicação de um assistente técnico competente. Além do trabalho especializado, a simples presença do assistente técnico inibe o mau perito, e representa uma “vacina” contra uma eventual corrupção pericial.

2) Senhores advogados das empresas, considerem junto aos seus clientes a possibilidade de adiantar os honorários periciais (ainda que não solicitados), via processual. Se pensarem bem, essa atitude minimiza a possibilidade de corrupção pericial por fatores financeiros, e pode representar um grande investimento para o sucesso de suas pretensões.

3) Senhores Juízes, desconfiem de peritos que sempre beneficiam os empregados, e que só atuam em processos que envolvam empresas com capacidade econômica considerável. É provável que isso não seja uma mera coincidência.

4) Senhor Deus, que os bons continuem sendo a maioria... e que o Senhor nos livre do mal.


Um forte abraço a todos.


Marcos Henrique Mendanha
E-mail: marcos@asmetro.com.br
Twitter: @marcoshmendanha"

2 comentários:

Eduardo Henrique Almeida disse...

Este é um debate urgentíssimo. O perito, por definição, precisa ser absolutamente isento e independente, tanto quanto o magistrato. Todas as distorções que influam na autonomia técnica e isenção do perito devem ser afastadas. Entendo que peritos (não assistentes técnicos)devam ser uma carreira do Estado devidamente estruturada e valorizada. Já propusemos isso neste espaço, a perícia médica da união. Começando pela Justiça Federal.

Anderson disse...

Só não existe corrupção nos peritos que recebem menos e não reconhecem o nexo de causalidade... Faz-me rir!!! Oh!! como as empresas são idôneas...