Tema recorrente que demanda mais debate, pois ainda não foi pacificado. Inicio meu modesto ponto de vista pessoal destacando o plural "advogados" do título. Sim, a presença do advogado do autor assegura o direito de presença do advogado do Reclamado, já que ambas as partes têm os mesmos direitos processuais. Neste cenário vivenciaríamos debates entre interesses diversos dentro de um, em geral pequeno, consultório médico. O documento final deixaria de ser um Laudo e passaria a ser uma Ata, já que construído sob muitas autorias ou influências. O absurdo da cena nos chama à razão regressando a uma reflexão preliminar sobre o que significa Perícia Médica e sua inserção nos universos tanto da Medicina quanto do Direito.
A relação médico-paciente [1] existe mesmo em ambiente pericial, situação onde a medicina está sendo chamada a auxiliar o Juízo, o que não pode ser feito sob violação de seus princípios (da medicina). Medicina é o exercício de uma relação humana de confidencialidade e privacidade. É na privacidade do consultório que se revelam as fraquezas, as contradições, os temores do ser humano sendo vedado ao médico expô-lo publicamente; muito mais do que a nudez. Se em uma consulta assistencial o paciente prefere ficar nu, cabe ao médico o dever de pedir para cobrir-se, expondo apenas o necessário à sua avaliação. Se numa perícia o periciando expõe questões que não interessam à Perícia, cabe ao perito exercer sua habilidade e trabalhar no interesse do Juízo preservando o indivíduo em sua dignidade. Assim, creio que nem a vontade do paciente, aqui periciando, deva prevalecer sempre, cabendo ao médico a condução de seu trabalho nos limites éticos.
É certo que alguém que ingresse em Juízo esteja disposto a ter sua privacidade debatida, mas o médico deve ser guardião dos limites, para isto tem formação Médica. Em um consultório, não pode haver presença de pessoas estranhas ao universo médico pois, além do exposto, não estaríamos acrescendo nada que venha a contribuir efetivamente para a elucidação dos fatos. Teríamos uma ou mais presenças constrangedoras, inibidoras sobre a livre manifestação do periciando, presenças não comprometidas necessariamente com o que busca o perito, mas com o que seja do interesse do cliente ou da parte oposta.
A perícia médica envolve a observância das expressões faciais, posturas, respostas a manobras médicas, sendo sempre desejável que não haja nada a reforçar ou inibir condutas de um lado e rações de outro; pois disto depende a conclusão segura e verdadeira que auxiliará o Juízo. É equivocado atribuir a perícia a classificação como ato judicial, como argumentam advogados [2]; não é, a perícia médica é ato médico cuja conclusão é auxiliar e nem mesmo vinculativa do Juízo.
Alegam os advogados direitos conferidos pelo Estatuto do Advogado da OAB, Art. 7o [3]. inciso I, III, IV, letra “c” e “d” do EAOAB, Lei n. 8.906/94”. Já o CFM, através de uma de suas seccionais, o CREMESP, se manifestou que o médico em função de perito não deve aceitar qualquer tipo de constrangimento, coação, pressão, imposição ou restrição que possam influir no desempenho de sua atividade que deve ser realizada com absoluta isenção, imparcialidade e autonomia, podendo recusar-se a prosseguir no exame e fazendo constar no Laudo o motivo de sua decisão [4].
Como seria o caso de o perito contábil fazer suas contas com o advogado, ou advogados das partes sentados ao seu lado? E em uma cena de crime onde os peritos colhem provas?
A Lei do Ato Médico, 12.842/2013 [5], estabelece que a REALIZAÇÃO da perícia é ato privativo do médico. In literis: Art. 4o São atividades privativas do médico: (...) XII - realização de perícia médica e exames médico-legais,(...)
O Advogado de qualquer das partes tem garantido o acesso à perícia, entendida aqui
como Laudo médico-legal; mas não tem direito a acesso à perícia,
entendida agora como ato médico, característica inarredável no interesse da Justiça e da Sociedade. Ao ato médico pericial é garantido às partes se fazerem acompanhar ou representar por assistentes técnicos médicos, o que assegura o direito ao contraditório e à verificação da lisura da perícia com propriedade de quem também detém conhecimento médico.
Eduardo Henrique Almeida é perito previdenciário, perito judicial, integra a Câmara Técnica de Perícias Médicas do CRMMG, especialista em Medicina Legal e Perícias Médicas pela AMB e professor de Perícias Previdenciárias da Fundação UNIMED.
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[1] http://revistabioetica.cfm.org.br/index.php/revista_bioetica/article/view/618
[2] http://admin.oabpr.org.br/imagens/downloads/526.pdf
[3] Art. 7º São direitos do advogado:
c) em qualquer edifício ou recinto em que funcione repartição judicial ou outro serviço público onde o advogado deva praticar ato ou colher prova ou informação útil ao exercício da atividade profissional, dentro do expediente ou fora dele, e ser atendido, desde que se ache presente qualquer servidor ou empregado;
d) em qualquer assembleia ou reunião de que participe ou possa participar o seu cliente, ou perante a qual este deva comparecer, desde que munido de poderes especiais.
[4]http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/crmsp/resolucoes/2005/126_2005.htm
[5] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2013/Lei/L12842.htm