sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Ponto de Vista - Estudiosos da lei ou justiceiros?

A Lei nem sempre é clara - fazendo um plágio livre (ou licença poética) do famoso locutor esportivo da Globo, Arnaldo César Coelho, penso que, talvez diferentemente do bordão que preconiza o que poderia ocorrer no âmbito da justiça desportiva, nas outras áreas do Direito a Lei nem sempre é clara, para sorte dos advogados, mas também dos réus, já que há a possibilidade de ler nas entrelinhas, de fazer sua exegese, de formar correntes de jurisprudência dentro da hermenêutica - oposto da hermética - e de tornar explícito algo que é subreptício ou que não está tão claramente redigido - às vezes propositadamente – pelo legislador.

Mas, existem leis que são bastante claras e que não permitem digressões de hermenêutica.Não sei se são a maioria, a minoria ou quantas são, mas sei que elas existem.Tenho a impressão de que, no entanto, para determinados Procuradores, que também não sei se são a maioria ou minoria, TODAS as leis, sem exceção, nunca são claras!E a resposta que estes sempre dão é: depende!Se a população não reclama, então está tudo bem, pois a lei parece que depende da vontade e da pressão das pessoas, e não do que está irrefutavelmente escrito?

Para dados Procuradores a impressão que perpassam é a de que a lei tornou-se mero resultado matemático da média aritmética da vontade da maioria da população de seu universo particular, a partir de determinados critérios de julgamento também muito particulares. Sem querer acabam agindo como legisladores discricionários de um universo restrito a si próprios, o que, lógica e inevitavelmente, acaba incorrendo em uma dose alta de leviandade e arbitrariedade. Parece que estes também acabam por perder seus limites, tencionando agir como juízes, fazendo recomendações que ganham a aparência de uma sentença judicial. Para quem acha que pode tudo, que o poder é ilimitado, abusando mesmo dos limites éticos de sua autoridade, outras tantas vezes ganham o semblante de políticos do executivo, parecendo incorporar um espírito de prefeitos ou de deputados ou de presidentes de órgãos, como nas vezes que assistimos a PFDC publicando enunciados para ensinar ao INSS e aos médicos como deveria ser o seu trabalho. Até mesmo tecnicamente querem intervir, como se soubessem mais de medicina do que os médicos. Em resumo: este tipo de Procurador, como para si a lei nunca é clara, também acaba nunca sendo claro, reflexo natural de sua postura exorbitante, resultando em um profissional que não sabe quem é, já que quer ser vários seres ao mesmo tempo.Em nível molecular o câncer se comporta analogamente. São Procuradores, executivos, legisladores, médicos, juízes ou o quê?Depende?

No INSS, por exemplo, as coisas funcionam muitas vezes assim quando alguma denúncia para nas mãos deste tipo de Procurador: se a denúncia vem do povo pobre e hipossuficiente, principalmente se for de muita gente, ainda que seja uma grande mentira e calúnia, mas somente porque muita gente ficou revoltada pelo resultado de uma perícia contrária às suas pretensões - e que, ao invés de seguirem pela via naturalmente esperada de resolver a questão, ou seja, entrar com recurso no próprio INSS – vários atores entram em cena como se já houvesse um script pronto e resolvem , ao que tudo leva a crer, de maneira orquestrada por determinados políticos locais, advogados sem pudor e sindicalistas, agir de modo a contribuir para promover o verdadeiro sacrifício público, humilhação, assédio, tortura, falta de respeito, covardia contra o perito médico.Ignorância ou má fé? Justiceiros ou estudiosos da lei?

Este tipo específico de Procurador acha muitíssimo verossímil a queixa, simplesmente porque um grande número de pessoas foram reclamar.Não consideram ou ignoram (por ignorância simples ou não) que a função do perito, que igualmente à de qualquer fiscal ou decisão judicial que contraria um interesse (nem sempre legítimo – afinal, o que é a lei?), é passível de sempre e a todo momento causar descontentamento e revolta nas pessoas.Mas, para este dado tipo de Procurador isto já basta, não quer saber de testemunhas, não quer saber de fazer oitiva do perito que está sendo acusado/condenado ou de outros servidores, não quer saber de procurar ler o laudo médico pericial para saber se o que o cidadão reclamou encontra guarida naquilo que está consignado no LMP.Por exemplo, a Ouvidoria do INSS apresenta uma estatística, que consta do relatório do TCU de 2008, de que 85% das vezes em que um segurado reclama que : “ o perito nem olhou meu atestado...”, este atestado está fielmente registrado no laudo médico-pericial.Ou seja: mentirosos!O intuito, invariavelmente, destas pessoas é o de achacar o perito, coagindo-o e humilhando-o a fim de que este sinta-se intimidado e ameaçado e passe a ser menos, digamos, rígido, em suas conclusões periciais.Eles pensam que se entrarem com recurso administrativo a decisão não será reformada, o que é um engano.Em todo o caso há sempre a justiça.Mas, não! O intuito á fazer cumprir a política do holofote!Políticos se travestem de defensores dos coitados que tiveram seus benefícios negados pelos carrascos dos peritos, enquanto colocam no seu bolso o resultado daquilo que a corrupção conseguiu auferir à revelia deste mesmo povo que eles dizem defender.Mas, disto o povo não reclama!Ou quando reclama é do médico, sempre o responsável por tudo que há de errado na saúde, manipuláveis que são pelos espertalhões que lhes surrupiam ao mesmo tempo em que contam-lhe histórias de contos de fadas.

A execração pública está armada então.Os ingredientes são: um monte de hipossuficientes em tudo, não só financeiramente, mas moral e intelectualmente, que dão inveja ao Macunaíma - que não se incomodam nem um pingo em mentir e caluniar - fazem uma denúncia covarde; um Procurador que, baseado apenas no numerário das denúncias, e não no seu mérito, acolhe, adota procedimentos sumários sem o conhecimento dos peritos, já condenando-os ou coagindo-os, emitindo enunciados e recomendações a serem seguidos; e , por último, um jornalista, na maioria das vezes tendencioso igualmente, para dar projeção e holofote ao grande feito da autoridade.Não têm vergonha na cara , não?Ah, mas a falta de infraestrutura dos locais de trabalho dos peritos, a pouca vergonha dos sistemas de informática do INSS, as agressões físicas e verbais sofridas pelos peritos, a falta de estímulo à capacitação técnica destes, o assédio moral que todos os servidores do INSS sofrem no dia-a-dia, este tipo de Procurador não têm olhos para ver?!Será que incomodaria o governo?Mas, o governo não parece ser uma parte de sua própria personalidade que dá sintomas de padecer de uma patologia de personalidades múltiplas?Não seria dar um tiro no próprio pé ou, senão, rasgar o próprio bolso ou sonho de fama?

Atônitos, então, o primeiro contato dos peritos com a questão se dá já e somente quando lêem as recomendações exaradas.Aí é que começa a tortura psicológica e chantagem: poderíamos não seguir tais recomendações, afinal não são sentenças judiciais, são apenas recomendações - pensam por um breve momento.Então lhes acorre a idéia de que se não seguirem as recomendações serão denunciados por alguém que já dá toda a pinta de estar contaminado desde o princípio (sadismo? Recalque? sonho de fama e holofotes?Tudo isto? Nada disto?).Refletem que terão gastos com advogados, perderão noites de sono, terão que dispor de mais do seu já precioso tempo...até aí tudo bem, pois acho que, ainda que haja muita crítica ao judiciário, percebo, ao meu olhar pelo menos, que os magistrados, de um modo geral, são mais imparciais, coerentes, fiéis da balança, corretos.Afinal , para ser um magistrado a pessoa tem que ser mesmo muito diferenciada, o funil é enorme e acho, verdadeiramente, que só ficam os melhores.É claro que, como em todo lugar, há os bons e os bandidos, mas esta é uma outra história.Os peritos temem então o peso da mera vontade aritmética das pessoas X o peso de todas as evidências ou da falta delas – afinal , todos deveriam ser inocentes até prova em contrário – e resolvem se submeter às recomendações, não porque fossem culpados e nem porque acreditem que isto irá resolver os grande problemas, que continuam lá intocáveis, mas sim porque o desgaste que dará para descumprí-las será maior de que para acatá-las.Afinal , passar por uma psicoterapia não faria mal a ninguém e é capaz de todos os seres humanos terem pelo menos algum tipo de neurose que se beneficie disto - como já disse Freud – até mesmo este tipo de Procurador?

Tenho nojo e vergonha deste tipo de gente.Mas ainda resta uma esperança: um monte de peritos, talvez milhares, poderia fazer alguma manifestação contra um deste dado tipo de Procurador, usando do mesmo feitiço de que aquele se utiliza contra peritos.Se der o azar de pegar um Corregedor de Justiça que atue sob o preceito análogo ao seu, qual seja: “ a lei está abolida e passa a equivaler-se à média aritmética da vontade da maioria, sem análise do mérito, por livre e sumário convencimento pessoal “ - terão que cumprir algumas recomendações e seguir alguns enunciados do Corregedor também.Quem sabe algum destes enunciados não seja: “ não encha mais o saco dos peritos” ou então: “ por quê não chamam os peritos para ouvir o que eles têm a dizer antes de produzirem enunciados”

7 comentários:

Vandeilton disse...

Caramba! falou tudo. Como faremos a manifestação?

Snowden disse...

A imparcialidade é a base da Justica!
Assim como a CNJ fiscaliza o trabalho de juízes! A Corregedoria dos Procuradores!
As vezes, a razão de tudo é o Ego! Todos temos o id, ego e super ego e quando ocorre o predomínio do super ego ou enfraquecimento do id, a pessoa passa a ter um comportamento exorbitado, megalo e passa a incorrer, sentindo-se Deus, super-homem ou mulher maravilha, em alguém sem limites ou medos!
É quando falta o senso critico que esta o perigo!
Rodrigo, partindo desse Principio, da existência do Ego inflado, vem de encontro no indivíduo no caso em tela, partir de forma articulada com Jornalista, buscar a auto-promoção! A "autoridade" satisfaz o ego, assim como o "jornalista" que diante da cegueira psicológica "esquece dos outros atores envolvidos em qualquer litígio e o rito da busca de evidencias" e publica matéria tendenciosa e leviana!
Quanto a população, se vc tem mais de 70% recebendo ate 2 mínimos por mês, com menos de 5% com capacidade de poupança, com menos de 10% com nível superior, portanto, baixo nível sócio econômico, portanto passível de manipulação via bravatas políticas, vc nAo pode esperar muito! Veja que a classe dos peritos é extremamente intelectualizada e consequentemente nAo se deixa levar por fanfarronices! Sobre as evidencias, fica claro quem precisa de tratamento psicológico e talvez Neurolepticos...

HSaraivaXavier disse...

Excelente texto meu Caro Rodrigo. Foi diretamente na Origem do Problema. Sequer os elementos objetivos da lei são seguidos em matéria previdenciária. Temos dezenas de situações típicas como carencias, prazos e datas. Uma delas é o critério de 1/4 de salário mínimo para o BPC que, embora uma lei ordinária vota em congresso o tenha definido, os juiz simplesmente atribuem o critério que entendem ser mais "social". Na prática a lei previdenciária é um conjunto de restos de artigos todos quebrados pelas interpretações dos excelentíssimos. Outro dia um juiz determinou por aqui "pensão" para BPC LOAS, porque entendeu que caberia. Parte dos problemas da previdencia se deve a informalidade nas APS e ao achismo jurídico em prol do social.
Eu sugiro rasgar a lei, porque ficar cumprindo norma e apanhando aqui para juiz ficar "interpretando" de outra forma o que é objetivo não é justo.

Paulo Taveira disse...

Excelente artigo neste post Dr Rodrigo. Alguns se acham o Zorro mesmo!fazer justiça não é ser justiceiro!Parabéns pelo post!

Anderson disse...

O CNJ está na moda, mostrando que busca punição para os juízes; alguém já ouviu falar alguma coisa do CNMP?...

Rodrigo Santiago disse...

Obrigado a todos pelos elogios, em especial ao Heltron e Taveira, o qual deu-me uma excelente sugestão antes da publicação do texto,retrato da triste realidade em que tornou-se nossa atividade.Penso que as coisas não mudarão antes que uma postura e atitudes radicais da categoria for tomada contra este estado de coisas de maneira coletiva.

Anderson, realmente eu estava pensando justamente nisto outro dia e acho que cabe à sociedade desvelar o que uma liberdade quase ilimitada e quase sem critérios ou rédeas, na fronteira com a libertinagem, pode causar, para que a própria sociedade se mobiliza para exigir mudanças.No fundo mesmo acho que uma grande parcela destes males poderia ser resolvida se mais peritos fossem mobilizados e politizados.

Adriano Battista disse...

Juizes e promotores "punidos"? No Bostil, este "país" de bandidos? NUNCA!
Podem roubar, matar, fazer parte de quadrilhas, máfias, praticar corrupção à vontade... NADA lhes acontecerá!
Muitos se consideram verdadeiros "deuses", e julgam-se acima do bem e do mal, da lei e da ordem, do certo e do errado. Creio que a maioria deles seja assim.
Egos hipertrofiados. Não conseguem sequer esconder sua indisfarçável falta de humildade. Portadores da arrogância extrema.
Conduta ilibada? Ética? Huahuahuahuahuahua! LOL!