terça-feira, 14 de setembro de 2010

Terceirização Ideológica

O ministro da Previdência acolheu a liminar para, autorizado por ela, infringir a lei que veda a realização de perícias previdenciárias fora dos quadros concursados para este fim (lei 10.876/04). Recentemente outro fundamento legal (lei 8.213/91) foi burlado com a mesma e frágil sustentação liminar, a prorrogação de benefícios por incapacidade sem uma perícia médica que a suporte. Estaria a autoridade do Executivo apenas obedecendo a autoridade do Judiciário? Há indícios de que não.

O ministro da Previdência sonha com perícias feitas por médicos do SUS e médicos dos Centros de Referência em Saúde do Trabalhador, alinhado com o que defendem ardorosamente centrais sindicais fortemente atuantes dentro do ministério e na Câmara Federal. Recentemente buscou no exterior um modelo que valesse de paradigma para essa ideia e tentou elaborar um projeto de lei, não o fazendo por recomendação de sua própria assessoria jurídica. Agora, aguardem, vai tentar de novo.

Sem querer me passar por jurista, longe disso, percebo fragilidade nas liminares estranhamente perdidas pela AGU. Não seria interferência do poder Judiciário no poder Executivo determinar que as perícias tenham que ser feitas em 15 dias a qualquer custo? Mais, caso não se as faça, que contrate precariamente o artigo mais barato do mercado (sim, o médico) para a missão?
Se a moda pega, já que boa parte da população tem demandas que tramitam no judiciário há décadas, poderia haver uma medida judicial idêntica obrigando a autoridade a respondê-las em um prazo razoável ou contratar juízes credenciados, que tal? Olha, parece jogo combinado. Muito estranho.

Detalhe interessante e que denuncia a maracutaia é que a liminar condiciona a contratação de terceiros à impossibilidade ou ineficácia de medidas administrativas. In verbis, "em caráter excepcional, de médicos para a realização das perícias médicas, nas localidades onde a capacidade de atendimento das Agências da Previdência Social (APS) for superior ao prazo de 15 dias e desde que o represamento das perícias não possa ser efetivamente sanado através de outras providências administrativas"

O INSS não tomou qualquer iniciativa administrativa para resolver o problema, não chamou concursados aprovados e prontos para assumir, não deslocou peritos de áreas menos comprometidas e nem deslocou segurados para unidades que não tenham demanda, pagando o deslocamento conforme previsto em lei, o que certamente seria muito mais barato. Assim, o Ministério da Previdência, cumprindo apenas parte que lhe convém da liminar e a pretexto de uma greve, traz de volta o cenário de esculhambação, descontrole e desprofissionalização.

A hoje chamada Medicina Pericial evolui rapidamente para um modelo inspirado nos principais países, que proporcione economia processual e financeira aos usuários e à nação, que agilize o judiciário, que garanta isenção e autonomia técnica às perícias, mas encontra obstáculos inimagináveis como essa postura retrógrada e irrefletida que não representa o interesse do conjunto da sociedade.

2 comentários:

Unknown disse...

Eduardo, como vc sabe, os terceirizados são controláveis e descartáveis a qq momento. A separação de poderes, por outro lado, é um mito, que sucumbe facilmente aos jogos de poder. No Congresso, quem sabe, o horizonte de uma Perícia autônoma tem alguma chance de prosperar. O INSS não merece e não pode mais contar com essa nobre categoria em seus quadros. "Que comunhão pode haver entre a luz e as trevas?"
Chega de legitimar a incompetência administrativa e o aparelhamento ideológico do órgão, cada vez masi evidente.
Rodrigo

EU POR MIM MESMO disse...

Rodrigo,

Perfeitíssima e sábia as suas considerações acima.
Nota 10.